segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

O CORPO E O MOVIMENTO EXPRESSIVO



Jorge L. Schutze


Jal Oliveira: foto JSchutze
Via de regra todo movimento (e não movimento) do corpo é expressivo, se considerarmos que o corpo mesmo ao fingir uma determinada emoção, na prática expressa exatamente o que lhe acontece, quer o desvendemos ou não. A relação entre expressividade, corporeidade e emoção desde Francoise Delsarte, no início do século XX, fomenta os estudos teóricos das artes cênicas. Quando se compreende o corpo imbricado de suas múltiplas dimensões: psicologia, cognição, emoção, sensibilidade, biologia, etc. pode se dizer que o corpo na verdade expressa a si mesmo, já que na pratica a unidade corpo expressa um agenciamento de todos os fenômenos que lhe acontecem num determinado instante. Mesmo que um desses fenômenos seja exatamente ocultar o que sente, o corpo somente pode expressar a ocultação desse fenômeno, mesmo que ninguém além de si mesmo o possa perceber. Ou seja, o corpo fornece ao ambiente, através de sua corporeidade, um mapa de toda a sua condição a cada instante, mesmo em condições de isolamento.
                Segundo o neurocientista António Damásio são essas especificidades corporais que momento a momento também fornecem ao cérebro um mapeamento das suas condições, e que por meio da homeostase articulam o reequilíbrio, caso necessário, de suas funções. Em outras palavras, o corpo expressa-se também para si mesmo, ou como ele mesmo afirma, principalmente para si mesmo, realizando assim o fenômeno da consciência, talvez o quesito mais importante para a manutenção e evolução da vida do ser.
Jal e Alexandre: Foto JSchutze
                Tradicionalmente, nas artes corporais, expressividade refere-se à capacidade corporal de ordenar-se com eloquência e clareza, no intuito de provocar no outro determinados sentidos e percepções no âmbito estético intelectual, e com isso promover uma maior empatia emocional entre o artista e o espectador. Foi a partir de tais premissas que o trabalho de Stanislavski foi formulado. Para isso o corpo deveria ser treinado tecnicamente a fim de cumprir os seus propósitos enquanto artista cênico. É esta a ideia contida, por exemplo, num dos seus parâmetros fundamentais da interpretação do ator: a memória emotiva.
                Com base nos recentes estudos em neurociências (Damásio), identidade e cultura (Stuart Hall) e sistemas (Mario Bunge), hoje tais conceitos podem ser questionados. Se como disse anteriormente o corpo é sempre expressivo do que lhe acontece a nível emocional, como se podem enriquecer os estudos sobre expressividade, a fim de dar-se conta das exigências que o próprio corpo possui de manter-se não simplesmente vivo, mas “em vivacidade”, que é o que se espera minimamente de uma apresentação cênica?
                Rudolf Laban, precursor das técnicas contemporâneas de dança, preocupado com a falta de vitalidade dos atores e bailarinos de sua época, desenvolveu suas pesquisas focando-se basicamente nos estudos da mecânica do movimento humano, com isso poderia libertar o movimento e a dança de qualquer dominação estética.
                Irmgard Bartenieff, discípula de Laban, vai apostar na observação do desenvolvimento ontogenético (do embrião) e filogenético (das espécies), como uma chave para o destrave da movimentação corporal, tornando assim o corpo mais expressivo. E a partir dai formula sua técnica. As suas ideias influenciaram grandemente os estudos corporais, e também as práticas terapêuticas que se seguiram, tendo como base a noção ainda não de todo abandonada de que o corpo com suas vivencias na cultura, deparando-se com suas frustrações desenvolveria “couraças” musculares (Wilhelm Reich), e que um processo técnico-terapêutico poderia devolver-lhe a liberdade expressiva. Desse conceito desenvolveram-se várias técnicas e terapias corporais (Bionergética, Consciência Corporal, Somaterapia, etc.).
                Segundo os estudos de Christine Greiner, pesquisadora do corpo em seus processos artísticos, a diferença fundamental entre o corpo artista e o corpo não artista é a consciência de sua expressividade durante a sua apresentação pública, um sentido de presença que nada mais é do que uma consciência amplificada de tudo o que acontece no momento da apresentação incluindo-se aí a própria condição do corpo artista e seus sentimentos.
                Se para António Damásio é o movimento que gera a consciência, o exercício das possibilidades corporais, quando legitimamente motivadas promoveria uma maior consciência e por sua vez uma maior expressividade corporal. Se observarmos o nosso próprio movimento podemos constatar que para se gerar o movimento há necessidade de um nível de consciência, que na prática se confunde com o próprio movimento. Nesse sentido para que o corpo se torne expressivo e preciso que se insista na consciência, que em todo caso é sempre aqui e agora, mesmo no caso das lembranças ou dos projetos futuros, já que estão sendo sempre vivenciados no presente.

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